
Entender a distinção entre um evento único e uma condição crônica é o primeiro passo para o diagnóstico e o cuidado corretos.
Presenciar alguém passando por uma crise com tremores intensos e perda de consciência é uma cena que gera aflição e muitas dúvidas. A primeira pergunta que surge é: "isso é epilepsia?". Embora os termos sejam usados quase como sinônimos no dia a dia, é crucial entender que convulsão e epilepsia não são a mesma coisa.
Compreender essa diferença é fundamental não apenas para desmistificar o assunto, mas também para saber como agir corretamente e quando buscar ajuda especializada. Vamos esclarecer cada um desses conceitos.
O que é uma convulsão?
Uma convulsão é um evento neurológico agudo e transitório. Ela ocorre devido a uma descarga elétrica anormal, excessiva e sincronizada de neurônios no cérebro, funcionando como um "curto-circuito" temporário. Essa atividade descontrolada interrompe a função cerebral normal e gera manifestações involuntárias.
A forma mais conhecida é a crise tônico-clônica, que envolve contrações musculares vigorosas (tremores), enrijecimento do corpo e perda de consciência. No entanto, uma crise de origem cerebral pode se manifestar de várias formas, nem todas envolvendo abalos motores.
Quais são as causas comuns de uma convulsão?
Ter uma convulsão não significa, necessariamente, ter um diagnóstico de epilepsia. Diversas condições podem provocar um episódio isolado. As causas são divididas entre provocadas e não provocadas.
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Causas provocadas (ou reativas): ocorrem como uma reação do cérebro a um estresse agudo, como febre muito alta (comum em crianças), traumatismo craniano, infecções como meningite, alterações metabólicas (ex: hipoglicemia) ou abstinência de álcool e outras drogas.
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Causas não provocadas: acontecem sem um gatilho imediato identificável e podem estar ligadas a uma predisposição do cérebro, que é a base da epilepsia.
O que caracteriza a epilepsia?
A epilepsia, por sua vez, é definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma doença neurológica crônica. Sua principal característica é a predisposição duradoura do cérebro para gerar crises epilépticas espontâneas e recorrentes.
Trata-se de uma doença neurológica crônica, diferenciada de um episódio isolado pela recorrência das crises convulsivas. Estudos mostram que a epilepsia é uma condição contínua na população, com impactos a longo prazo e que demanda a utilização de serviços de saúde.
Em outras palavras, enquanto a convulsão é o evento, a epilepsia é a condição de base que torna a pessoa suscetível a ter esses eventos repetidamente ao longo da vida. É importante notar que, mesmo com o tratamento medicamentoso adequado, cerca de um terço das pessoas com epilepsia pode continuar apresentando crises.
Esta condição pode exigir avaliações e tratamentos especializados, incluindo cirurgia em alguns casos, e a implementação de modelos de cuidado contínuo para o paciente.
Quando um evento convulsivo leva a um diagnóstico de epilepsia?
O diagnóstico de epilepsia geralmente é estabelecido por um neurologista quando uma pessoa apresenta duas ou mais crises epilépticas não provocadas, com um intervalo maior que 24 horas entre elas.
Uma única convulsão, especialmente se tiver uma causa clara e reversível como febre, normalmente não é suficiente para diagnosticar a doença. A epilepsia é uma doença cerebral diagnosticada quando a pessoa tem duas ou mais crises (convulsões) não provocadas, com mais de 24 horas de intervalo entre elas, ou quando há um diagnóstico de síndrome epiléptica.
O médico irá realizar uma avaliação clínica detalhada, podendo solicitar exames como o eletroencefalograma (EEG) e exames de imagem, como ressonância magnética, para investigar a atividade elétrica cerebral e a estrutura do cérebro.
Existem outros tipos de crises epilépticas além da convulsão?
Sim. É um erro comum associar epilepsia apenas a convulsões. As crises epilépticas podem se manifestar de formas muito distintas, dependendo da área do cérebro afetada. Alguns exemplos incluem:
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Crises de ausência: comuns na infância, a pessoa fica com o olhar fixo e "desligada" do ambiente por alguns segundos, retornando ao normal sem perceber o que aconteceu.
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Crises focais: a atividade elétrica anormal fica restrita a uma parte do cérebro. Os sintomas podem ser movimentos involuntários de um braço, alterações na percepção (cheiros, sons) ou sensações estranhas, com ou sem perda de consciência.
Qual é, então, a principal diferença?
Para simplificar, a relação entre convulsão e epilepsia pode ser comparada à relação entre febre e infecção. A febre é um sintoma, um evento que sinaliza algo errado. A infecção é a doença que causa a febre.
Da mesma forma, a convulsão é um sintoma, enquanto a epilepsia é uma das doenças que podem causá-la de forma recorrente.
Como agir durante uma crise convulsiva?
Saber o que fazer pode proteger a pessoa de ferimentos. Manter a calma é o primeiro passo.
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Proteja a cabeça: ampare a cabeça da pessoa com algo macio, como um casaco ou travesseiro, para evitar traumas.
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Vire a pessoa de lado: assim que possível e com cuidado, posicione a pessoa de lado. Isso ajuda a evitar que ela se engasgue com a saliva ou vômito.
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Afaste objetos perigosos: retire móveis, cadeiras e outros objetos de perto para que ela não se machuque durante os tremores.
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Afrouxe as roupas: desabotoe colarinhos, gravatas ou qualquer peça que possa dificultar a respiração.
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Não segure a pessoa: nunca tente conter os movimentos ou colocar objetos na boca dela. Isso pode causar fraturas, lesões ou machucar quem está ajudando.
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Marque o tempo: observe a duração da crise. Se passar de 5 minutos, chame uma ambulância imediatamente.
Após a crise, a pessoa pode se sentir confusa e sonolenta. Permaneça ao lado dela, converse de forma calma e explique o que aconteceu até que ela se recupere completamente.
Quando procurar ajuda médica?
É fundamental buscar avaliação médica após qualquer episódio de convulsão, especialmente se for o primeiro. Procure um serviço de emergência ou um neurologista nas seguintes situações:
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Se for a primeira crise convulsiva da pessoa.
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Se a crise durar mais de 5 minutos.
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Se a pessoa tiver dificuldade para respirar ou ficar azulada (cianótica).
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Se ocorrer outra crise logo em seguida.
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Se a pessoa se machucar durante o episódio.
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Se a crise acontecer na água.
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Se a pessoa tiver condições de saúde pré-existentes, como diabetes, doença cardíaca, ou estiver grávida.
O diagnóstico correto feito por um especialista é o caminho para o tratamento adequado, permitindo que a pessoa com epilepsia ou que sofreu uma convulsão por outra causa tenha qualidade de vida e segurança.
Este conteúdo tem caráter informativo e não substitui avaliação médica. Em caso de dúvidas, procure um especialista habilitado.




